Scott Weiland: Stone Temple Pilots, Velvet Revolver e o Charme do Caos

Scott Weiland nunca foi previsível. De seu início no Stone Temple Pilots (STP), onde navegou entre o grunge e o glam, até sua fase no Velvet Revolver, ele redefiniu o que significava ser um rockstar na era moderna. Esta é uma análise sobre a carreira de um artista que fez da contradição sua maior obra de arte, equilibrando o talento melódico com o charme do caos.

O Charme da Contradição: Performance, Grunge e a Alma Pop de Scott Weiland

A primeira vez que vi “Plush” na MTV, lá nos anos 90, pensei que fosse mais um Pearl Jam genérico. Tinha aquele mesmo clima de dor existencial, filtro sépia e cara de quem carrega o peso do mundo nas costas. Scott Weiland aparecia de camisa aberta, o cabelo meio ruivo, o olhar torto — e, pra mim, parecia um figurante do grunge tentando parecer importante.

Na época, o Stone Temple Pilots soava como o primo rico das bandas de Seattle. Mais limpo, mais produzido, menos visceral. Eu não gostei. Aliás, eu torci o nariz por anos.

Mas o tempo tem dessas ironias. A gente amadurece, ou pelo menos cansa das mesmas certezas, e começa a ouvir de novo o que antes ignorava. Revisitando Core e Purple, percebi que o STP não era só mais um clone. Era uma banda que se escondia atrás da estética do grunge pra fazer o que queria: rock de arena com cheiro de classic rock e alma pop. E Weiland — que eu achava apenas um poser — era na verdade o maestro desse disfarce.


Stone Temple Pilots. A guinada e o pop escondido dentro do peso

Ele tinha noção de imagem, de performance, de espetáculo. Entendia o palco como território de ficção, onde cada gesto é um personagem. Enquanto os outros vocalistas da época pareciam estar se desculpando por estarem ali, Weiland parecia dizer: “sim, eu sei que é um show — e é pra ser”. Essa diferença de postura fez com que o STP envelhecesse melhor que muito nome “intocável” dos anos 90.

A grande jogada, a virada de chave, veio de forma descarada no segundo álbum. O STP deixou de ser a sombra do grunge para ser a sombra do glam de Bowie e do power pop dos anos 70.

Escutar “Interstate Love Song” hoje é quase como ouvir uma música dos anos 70 tocada com roupas dos anos 90. A melodia é irresistível, o groove é redondo, e o vocal desliza entre o desespero e a sensualidade. Tinha mais Cheap Trick do que Soundgarden ali.

Com “Vasoline”, no álbum Purple, a esquizofrenia musical se tornou explícita. Era um rock sujo e psicodélico que beirava o art rock britânico, com Scott Weiland rebolando de óculos escuros e cabelo tingido. Ele estava se afastando da camisa de flanela e caminhando, com um cinismo elegante, na direção do figurino de palco e da androginia.

E talvez essa seja a grande sacada do Stone Temple Pilots: enquanto o grunge fingia ser cru e anti-comercial, eles soavam polidos e não tinham vergonha disso. Eles eram rock stars se divertindo ao interpretar a morte do rock star.

Quando chegou “Big Bang Baby”, então, tudo ficou ainda mais claro. O clipe era uma colagem de referências: luz estourada, cenário branco, Weiland rebolando como se fosse um Iggy Pop limpo e ensaiado. Lembrava os Stones em “She’s So Cold” e “It’s Only Rock ’n Roll” — aquele mesmo tipo de ironia autoconfiante, de quem sabe que está vendendo algo e se diverte com isso.

Big Bang Baby e o clima parecido com She so cold

Era uma mistura de paródia e homenagem, uma piscada cínica pro rock que ele amava e zombava ao mesmo tempo. E o mais curioso é que funcionava. O STP estava em outro planeta: tocava no rádio, lotava shows e ainda assim parecia desconfortável com o próprio sucesso. E Weiland era o espelho disso — um cantor que oscilava entre o brilho e a autossabotagem, entre o charme e a ruína.


A autodestruição como estética

Scott Weiland era bom nisso: transformar descontrole em estilo. Ele tinha algo de Bowie, um quê de Morrison e uma autopercepção perigosa — sabia o que o público via e explorava até o limite. Era o tipo de artista que via na própria decadência um palco alternativo.

Quando subia em cena, parecia sempre no fio da navalha: um passo pra frente e virava estrela, um passo pro lado e despencava no abismo. E talvez fosse isso que tornava tudo tão magnético.

As drogas, claro, estavam sempre ali, quase como um personagem fixo da história. Não como desculpa ou glamourização, mas como presença — como aquele amigo que você sabe que vai estragar a festa, mas não tem coragem de expulsar. Weiland vivia em guerra consigo mesmo. Um dia sóbrio, outro em coma químico.

Mas a parte mais intrigante era como ele transformava esse caos em arte lírica. Músicas como “Sour Girl” e “Atlanta” não eram apenas baladas melancólicas, mas relatórios íntimos sobre o próprio declínio, escritos com uma beleza quase poeticamente doentia. Ele não estava se escondendo; estava fazendo um diário de bordo da tragédia, vestindo-o com a melodia mais pop possível.

Ele entendia que a imprensa e o público precisavam da história do rockstar em colapso para alimentar a narrativa do rock ‘n’ roll. Ele não era apenas um viciado lutando, ele era o ator principal em sua própria tragédia mitológica, usando cada recaída como um novo ato no espetáculo da autodestruição. Era o tipo de cara que podia cantar “Creep” com uma expressão de êxtase e tristeza ao mesmo tempo, como se soubesse que estava condenado, mas ainda queria dançar antes do fim.


Velvet Revolver: o Guns com um vocalista diferente

Quando ele apareceu no Velvet Revolver, eu confesso que ri. Parecia a jogada de marketing perfeita: os órfãos do Guns N’ Roses juntando forças com o ex-grunge mais estiloso da praça. E, de certo modo, era exatamente isso. Um projeto pensado pra soar como o passado, mas com a cara de quem ainda queria ser relevante.

O resultado? Divertido. Não genial, não revolucionário — mas legal. O Velvet Revolver soava como o Guns que deu certo, com um vocalista que sabia dosar pose e entrega. Weiland parecia confortável em meio àqueles riffs de Slash, como se tivesse encontrado um cenário sob medida pra sua persona teatral.

Mas também ficou claro que ele não era do tipo que se encaixa. A banda durou o suficiente pra mostrar potencial — e o inevitável atrito veio logo depois. O ego de um artista que vive de contradição não sobrevive muito tempo num projeto coletivo.


Entre o palco e o precipício

Scott Weiland morreu do jeito que viveu: flertando com o caos. Não foi mártir, nem gênio incompreendido — foi só um cara talentoso demais pra ser previsível e confuso demais pra durar. E isso não é pouco.

Em tempos de carreiras plastificadas e discursos calculados, ele parecia saído de uma era onde errar ainda fazia parte do charme.

O Stone Temple Pilots nunca foi a invenção da roda. Mas era uma banda sólida, com senso melódico afiado e um vocalista que entendia a importância do risco. Hoje, soa mais moderno do que boa parte dos ídolos da época. Enquanto o Pearl Jam virou uma instituição respeitável e previsível, o STP manteve um ar de banda que podia desandar a qualquer momento — e isso é o que mantém o rock vivo.

Eu demorei pra perceber isso. Na época, achava que autenticidade era sinônimo de sofrimento. Que quem se arrumava demais não podia ser verdadeiro. A bobagem típica de quem acredita em pureza no rock.

Weiland, com toda sua sujeira estilizada, me provou o contrário. Ele mostrava que a performance também é verdade — desde que o artista saiba que está encenando. E ele sabia.


O charme da contradição

Scott Weiland não foi um santo, nem um vilão. Foi um artista que existiu no limite, equilibrando talento e tragédia, vaidade e sensibilidade. O tipo de sujeito que parecia saber que tudo ia dar errado, mas não via sentido em desistir mesmo assim.

E talvez seja por isso que a imagem dele ainda resiste: porque era real o bastante pra errar e bonito o suficiente pra ser lembrado.

No fim, ele era um cantor, um ator, um viciado, um estilista de si mesmo. Um cara que sabia usar o microfone e o espelho com a mesma intensidade.

E mesmo que o STP nunca tenha sido a banda mais inovadora do mundo, o conjunto da obra de Weiland deixa uma lição: às vezes, o rock não precisa de redenção — só de um bom figurino, uma boa pose e alguém disposto a se perder de vez em quando.

Scott Weiland foi isso tudo. E talvez, olhando de longe, isso seja mais do que o suficiente.

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